É preciso implementar de vez o Código Florestal na Amazônia, diz ministra da Agricultura

Ao falar da Europa e das críticas de líderes europeus ao Brasil por conta do desmatamento, Tereza Cristina afirmou que “tem muita gente que fala muito mal sem saber“. “O mundo todo tem uma preocupação com o ambiente, mas focaram o Brasil. Há coisas inequívocas: em 66% do nosso território a vegetação nativa está de pé”, disse a ministra.

Tereza Cristina defendeu a implementação do Código Florestal: “A gente precisa parar de questionar o Código Florestal. É uma lei, foi feita, foi discutida, está aí e precisa ser implementada. Cada vez que tem 1 questionamento, uma dúvida jurídica, vai protelando a implementação. A gente precisa implementar esse Código Florestal. E fazer a regularização fundiária, levando o desenvolvimento”. O código define os locais que precisam ter a vegetação conservada. Ainda regula

No momento em que o Brasil é criticado por sua política ambiental, a ministra Tereza Cristina (Agricultura) defende que a implementação efetiva do Código Florestal pode ajudar a reduzir o desmatamento na floresta amazônica.

A medida, aprovada em 2012, define as áreas que devem ter a vegetação conservada e as que podem ser usadas para agricultura e pecuária, com a previsão de punições para o proprietário da terra em caso de infrações.

Em entrevista à Folha, a ministra disse ainda não acreditar que a exportação brasileira poderá ser afetada por uma eventual vitória do democrata Joe Biden nos Estados Unidos sobre o presidente Donald Trump.

Para ela, a relação institucional entre os dois países deve ser mantida.

O agronegócio tem sido o motor da economia mesmo durante a pandemia do novo coronavírus. O acordo entre Estados Unidos e China para aliviar a guerra comercial pode afetar as exportações brasileiras?
Neste momento, não. A safra atual já foi vendida e está sendo escoada. A safra do ano que vem também já foi, em boa parte, vendida. Estou falando de grãos, basicamente, soja e milho.

A do ano que vem está muito bem encaminhada, e já tem gente fazendo fechamento de preço futuro de 2022 no algodão, na soja e no milho.

Mas, futuramente, há risco de enfrentarmos um cenário negativo?
Nós estamos vivendo um momento diferente. Além da pandemia do novo coronavírus, a gente tem muitas variáveis que podem afetar [as exportações]. Não tem muito lugar para comprar esse volume de que o mundo precisa hoje.

Se os Estados Unidos vão vender mais para a China, a gente vende para algum lugar para o qual ele deixará de vender. Mercado é uma coisa ágil. Hoje, o agricultor conhece o mercado. Nós temos já previsão de um volume maior para o ano que vem.

O ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, usa a tese de que o alinhamento entre Estados Unidos, Brasil e Austrália poderia emparedar a China, que teria de comprar desses países mesmo que eles imponham restrições a negócios chineses, como o 5G. Ela está refém?
Sempre tem outro fornecedor. Estou dizendo que o volume que Estados Unidos e Brasil produzem é muito significativo em relação a outros países. Onde você vai buscar soja quando pensa em soja? Nos Estados Unidos e no Brasil.

A nossa soja tem vantagens comparativas que outros países não têm por causa do nosso clima. O Brasil é muito importante, e a China pode ter, se essa teoria prevalecer, um problema em um primeiro momento. Mas mercado é mercado, se ajusta.

Se o Brasil colocar restrição ao 5G, as exportações poderão ser afetadas?
Não sei como ela [a China] reagiria.

O resultado da balança com a China é quase dez vezes maior do que com os Estados Unidos. O Brasil não deveria se alinhar mais aos chineses?
Nós temos um alinhamento com os Estados Unidos, mas também temos um alinhamento com nossos parceiros comerciais. Aqui, trabalhamos todos os mercados para os quais temos condições de vender. E tem a Índia. Estávamos começando a trabalhar quando veio a Covid.

A Índia é a China de dez anos atrás. Ela vem crescendo a taxas assustadoras e [tem] cidades muito populosas que estão em transição de hábitos alimentares. A Índia é um potencial enorme para o Brasil, inclusive para o etanol.

A sra. pertence à bancada do agronegócio, que tem a China como principal cliente. Cogita deixar o governo caso o embate com a China ameace seu apoio político?
Não vejo isso como um problema para eu deixar ou ficar no governo. Vejo como um problema econômico que precisa ser discutido com serenidade, bom senso e olhando números.

O Brasil perderá mercado na União Europeia por causa do aumento do desmatamento ambiental?
Não tenho visto isso. A Amazônia é um assunto muito empolgante, mas é necessário nivelar esse assunto. Tem muita gente que fala muito mal sem saber. E tem gente que fala coisas que procedem e precisam ser corrigidas. A agricultura anda com a sustentabilidade.

 

O que o Ministério da Agricultura pode fazer para mudar?
A regularização precisa ser feita em todo o Brasil. Mas, na Amazônia, 88% dos produtores pequenos somam quase 500 mil propriedades.

Isso a gente tem de resolver, porque aí chegarão a política pública do crédito e as boas práticas do manejo. Até do fogo, porque o fogo é um manejo agrícola se bem-feito. Hoje, tem outras tecnologias para não usar.

Que erros foram cometidos na preservação da Amazônia?
A gente precisa implementar de vez o Código Florestal. A gente precisa parar de questionar o Código Florestal. É uma lei, foi feita, foi discutida, está aí e precisa ser implementada.

Cada vez que tem um questionamento, uma dúvida jurídica, vai protelando a implementação. A gente precisa implementar esse Código Florestal. E fazer a regularização fundiária, levando o desenvolvimento.

Desenvolvimento não quer dizer que você vai ter a degradação ambiental. Quando tem pobreza, as pessoas não têm como se manter. Aí, você tem perigo.

Como alterar a imagem negativa do Brasil no exterior? A sra. mesmo já foi chamada de “senhora do desmatamento”.
Que coisa, né? Acho que mostrando as ações. Os países têm de conhecer e respeitar nossa legislação. Quem faz as leis do Brasil são os congressistas, e eu, como congressista, tenho de acreditar nisso.

Eu vim pra cá eleita por aqueles que acreditam no que eu falo. Os questionamentos podem ser feitos.
O mundo todo tem uma preocupação com o ambiente, mas focaram o Brasil. Há coisas inequívocas: em 66% do nosso território a vegetação nativa está de pé.

A imagem no exterior é que o governo brasileiro estimula o desmatamento.
Nenhuma lei foi mudada por esse governo. Elas continuam as mesmas. Quem não está cumprindo e seguindo a lei vai ter consequências. A não ser que o Congresso revogue o Código Florestal e faça uma nova lei. Não vejo esse estímulo.

O Código diz que hoje 80% de uma propriedade na Amazônia precisa estar de pé. Você só pode usar 20%. Quem estiver fazendo diferente está fora da lei. E a lei prevê multas. O que talvez precisássemos era sermos mais céleres nessa punição.

A vitória do democrata Joe Biden pode prejudicar as exportações para os Estados Unidos?
Eu acho que não. A gente conhece os democratas. São mais de centro do que o presidente Donald Trump, que é de direita. Mas não vejo esse impacto.

O Brasil é um ótimo parceiro para os Estados Unidos. Temos muitas coisas pra fazer em conjunto. O Biden vai adotar a linha que a gente já conhece.

Os democratas são conhecidos por serem mais protecionistas.
Sim, é verdade. Eles estarão mais ligados à Europa do que talvez o Trump tenha sido. Mas vamos ver.

A sra. defende um diálogo?
É claro. Com todos. Sou a favor de diálogo com todo o mundo.

Mas a aliança entre Bolsonaro e Trump não pode comprometer uma relação institucional do Brasil com um governo democrata?
Não vejo que isso seja um problema. Em todo início de governo, recomeça a relação. A relação pessoal dos dois é uma coisa, a institucional é outra. O Brasil é o Brasil. Os Estados Unidos são os Estados Unidos.

A sra. é a favor da privatização da Embrapa?
Não sou. E olhe que sou privatista. Mas não da Embrapa.

A pesquisa [que a Embrapa faz] é fundamental para o Brasil. Nós desenvolvemos com a Embrapa uma tecnologia tropical que ninguém tem no mundo. É nosso capital isso. Muitas coisas foram resultado disso, como a soja.

Nos Estados Unidos, toda a área agricultável já foi ocupada. Aqui não. E precisamos da Embrapa para pesquisa de cunho social. A pesquisa privada não alcança esse público.

A debandada no Ministério da Economia pode enfraquecer o ministro Paulo Guedes?
Não. Conheci o [ex-secretário de Desestatização, Desinvestimento e Mercados] Salim Mattar no governo. O problema é que, quando você vem da iniciativa privada, chega com uma expectativa. O tempo da iniciativa privada não é o da iniciativa pública. Imagino que o Salim tenha ficado frustrado.

Ele queria privatizar a Embrapa, ministra.
Em um primeiro momento, levaram todas as empresas com possibilidade de serem privatizadas. Depois, conversamos. Ele não queria, não.

O presidente deveria ter feito mais cedo um aceno para formar uma base aliada no Congresso?
Cada um tem um jeito de governar. O presidente, quando chegou, tinha uma maneira de pensar. Hoje, está trabalhando um pouco diferente, mas ainda assim é diferente dos outros governos pelos quais passei.

Mas ele está fazendo a mesma coisa que todos os outros faziam.
Parece que é a mesma coisa. Mas, antigamente, os partidos tomavam conta dos ministérios.

Quando o presidente entrou, ele me deu liberdade total para compor minha equipe. O presidente, em um primeiro momento, quis que fosse assim. Que a política não influenciasse na maneira de tocar o Executivo. Hoje, mudou de pensamento.

Foi um choque de realidade?
Pode ter sido. Ou viu que o resultado vai acontecer mais rápido. E o diálogo é muito bom. Vejo isso como uma evolução, como uma coisa boa.

O governo deveria enviar rapidamente a reforma administrativa ao Congresso?
Como deputada? Sim.

A senhora é filiada ao DEM. Apoia a reeleição de Rodrigo Maia à presidência da Câmara dos Deputados caso isso seja possível?
Gosto muito dele, e é meu amigo. Mas temos uma legislação que não permite isso. Se houver alguma mudança para a frente, acho que ele é um bom presidente. Agora, tem muita gente nessa fila. Acho que temos de esperar.

E se for possível?
É um bom quadro. Tem experiência e conhece a Câmara. Tem crédito com os deputados.

A sra. aceitaria ser candidata a vice-presidente em 2022?
Tem muita água para passar debaixo dessa ponte. Em política, dois anos são muita coisa. Mas seria uma honra. Qualquer pessoa gostaria de ser convidada para ser vice.

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